quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Ainda algum dia iria acontecer...

Joane, 6 de Fevereiro de 2012

Durante o jantar, a minha irmã Ana apontou para o retrato do meu avô materno que estava na parede.

- É o avô, Ana! - Disse a minha mãe.

Eu estava a meter uma garfada de comida à boca e levantei ligeiramente o olhar para a minha irmã.

- O avô Guilherme? - Perguntou a Ana.
- Não, este é o avô António. É o meu pai. - esclareceu a minha mãe

A Ana olhou para mim, associando o nome.
Arranjei uma desculpa para ir à cozinha. Falar do meu avô com toda a minha família à volta provoca-me uma nostalgia ainda maior. No entanto, apesar de estar na cozinha continuei atento à conversa.

- Onde está o avô António? - Perguntou a Ana.
- Tu sabes, Ana, já te expliquei.- respondeu a minha mãe.
- No cemitério? - questionou a minha irmã astutamente.
- Sim, o corpo está no cemitério e a alma foi para o céu para a beira de Jesus. - explicou a minha mãe.
- No céu? Com Jesus?
- Sim...
- Vamos rezar, mamã!
- pediu a minha irmã.

Enquanto rezavam, entrei na sala de jantar, pensando que a conversa terminaria ali.

- Olha, mamã, o avô está a rir para mim! - disse a Ana, apontando entusiasmada para o quadro.
- Mas não dá para ver muito bem isso nesse quadro, Ana. - Disse a minha mãe.
- E quando vem o avô? - perguntou a Ana.
- Vem um dia, Ana. - respondeu a minha mãe.
- Um dia!?... - e a Ana ficou a divagar e a imaginar.

O quanto eu gostaria de saber o que significaria para a minha irmã, Ana, esse "Um dia"...




Um abraço, avô...

António Campos Soares

4 comentários:

Anónimo disse...

O seu texto emocionou-me, fez-me lembrar uma situação semelhante que se passou comigo há largas décadas. A minha irmã mais nova, na altura mal sabia falar, ao passar na rua por um idoso manifestou-se com um "olha o vô...". Esta situação foi deveras estranha dado que ela tinha nascido aproximadamente um ano após a morte do nosso avô. Fez-me pensar na forma como as crianças interpretam o mundo que as rodeia, e a sua perspicácia que tantas vezes nos impressiona.

Um bem-haja.

António Campos Soares disse...

Grato pela partilha de sentimentos.
De facto, não deixo de me surpreender com a minha irmã e confesso que invejo a imaginação e os caminhos por onde ela divaga.
Um abraço,

António Campos Soares

Rui Mesquita disse...

Obrigado por este texto. Obrigado por me fazer, de uma forma tão simples e tão bonita, relembrar essa imaginação e fantasia de criança que tenho saudades de sentir.

Um abraço! :)

António Campos Soares disse...

Fiquei imensamente contente com as tuas palavras, Rui =)
Senti o mesmo com tu à medida que ia ouvindo as palavras e manifestações da minha irmã...
É bom sentir que fomos assim um dia e que há situações que no relembram isso...melhor ainda é encontrar momentos em que é possível sermos uma "criança" cheia de imaginação de novo =)
Abraço!