Será um ser dependente
enquanto seguir os caminho que não são os seus. Não será vitorioso enquanto lhe atribuírem sucessos atingidos numa batalha que
não é a sua. Será um feliz sem ânimo enquanto apenas contribuir
para uma felicidade que não é a sua. Este é o mais que conhecido Fidalgo
Maldição.
Continua sentado com a
chávena de chá que se vai esfriando nas suas mãos. Há muito que
os dias que contempla pela ampla janela, onde a vidraça é fustigada
por fortes chuvas, são cinzentos e com muito poucas horas de luz. É
uma tempestade perene e já não guarda em si esperança de
avistar dias de bonança.
Rodeia-se de diplomas
encaixilhados e cobertos por pó que se vai acumulando porque se
cansou de os limpar e os exibir magistralmente. Também não deixa
que os abrilhantem mais, salvo para um propósito diferente, que nunca aparece. Até
hoje não o levaram a nenhuma saída que não fosse a previsibilidade
dos mesmos resultados de sempre. É este o seu (só seu?) triste apanágio.
Está já gasto o veludo
dessa poltrona majestosa onde se senta e as almofadas estão
côncavas, como um caixão feito à medida para que o cadáver não
se mova com a mínima trepidação. Se tarda a bonança, sabe que não deve tardar o tempo para apenas sair dali solenemente deitado e embrulhado
num lençol de linho branco com insígnias que o prenderam e de pouco
lhe valeram.
Decisões dos passados
tempos de bonança com pesadas correntes consequenciais que o prendem
num luxuoso salão nobre quando já passou o tempo da nobreza e esse
é o seu cárcere.
Cai-lhe a chávena, espalhando-se os cacos nesse lustroso chão que emana o cheiro da cera. Arremessa os candelabros com velas acesas e começa a ver o fim, uma luz forte que se propaga e o aquece como os dias de sol que há tanto espera contemplar. Deixa para trás traz o robe de cores ridículas que rapidamente é consumido pelo fogo, assim como todos aqueles papéis escritos pela rotina. Sai e assoma-se-lhe o espanto quando vê o sol e apercebe-se que todo o cinzento, que via da janela, era uma ilusão criada pela desilusão que sentia. Quebra-se assim a Maldição do Fidalgo que, celebrando as ruínas de tudo aquilo que o prendia, se torna Fidalgo Libertação, Fidalgo Criação, Fidalgo Imaginação, Filho De Algo que há tanto ansiava.
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