Caminhava só e era
noite. Guiava-me a luz da lua cheia que criava contornos e silhuetas
ao longo do caminho, como se todos os ramos das árvores fossem
braços estendidos na ânsia de um abraço que aquecesse aquela noite
gélida. Parei para descansar e senti que alguém respirava ao meu
lado, partilhando comigo aquele amontoado de folhas. Não fui capaz
de dizer nada. Se seria medo ou qualquer outra sensação, não sei
dizê-lo. Talvez estivesse demasiado concentrado em tudo o que ali me
ocupava o pensamento e esse alguém falou. Perguntou-me, numa voz
doce de quem convida a um desabafo, se eu era feliz. Não soube
responder. Agora os meus pensamentos eram outros: rostos de pessoas
eram constantes no meu pensamento, algumas delas afirmavam com todo o
fervor que eram felizes (e eu perguntava-me: até quando?), algumas
diziam-me que nunca experimentaram essa sensação (e eu queria abraçá-las), outras já não recordavam o que era a felicidade
(padeciam do luto a partir do momento em que a esperança havia sido
sepultado à sua frente). Nenhuma daquelas imagens me ajudava a
responder a essa pergunta desse alguém que ainda não havia visto o
rosto. Esse alguém, de voz doce, voltou a repetir-me a mesma
questão.
[Ser feliz implicará ter
tudo o que ser quer ter?
E se eu quiser ir lutando
por ter sempre algo novo para não chegar a um momento de estagnação
por ter tudo e deixar de lutar mais, caindo num terrível e
dilacerante comodismo? Não seria um suicídio ilegítimo?]
Como se vagueasse nos
meus pensamentos, esse alguém passou-me a mão pelas costa e deixou
cair a cabeça sobre o meu ombro. A luz da lua numa viçosa esperança
iluminava cada vez mais o caminho e eu não via o fim. E para que
precisaria eu de vê-lo? Voltaria ao início daquele enigma...
Deixei-me cair para trás,
numa queda que parecia eterna e, sem recordar-me do momento em que o
meu corpo repouso sobre as folhas secas e estaladiças de Outono,
adormeci. O despertar foi esplêndido e inefável. Já não existiam escombros até onde os meus olhos conseguiam enxergar, as planícies
secas que estavam para lá das árvores, ontem despidas e hoje estão vestidas de um verde lustroso, tinham florescido, por baixo de mim
amparava-me agora a erva fresca e, no caminho que havia percorrido, não
era apenas um par de pegadas que o havia marcado, mas sim dois.
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