domingo, 30 de dezembro de 2012

Músicas para Escrever XXXIII, Epigram - What's Mine Is Yours


Jazia sozinho no sofá, embrulhando-se numa manta colorida por remendos. Nem nas noites mais frias de Inverno dormia na sua cama. Ficava no sofá da pequena sala com uma porta para a rua e nunca trancava a porta, acreditando que alguém poderia querer entrar para lhe dar algum conforto. A televisão ligada toda a noite para ter algumas companhia e já lhe eram familiares as vozes mais comuns como a voz de alguém próximo que o saúda na abertura do primeiro jornal e lhe deseja boa noite depois das últimas notícias, já que mais ninguém o faz.
A sua amada morrera acamada e havia-se habituado a ocupar o sofá para não perturbar o sono da pessoa que havia amado ao longo de toda a sua vida. Ali ficava e quando, por algum motivo, despertava durante a noite, espreitava pela porta entreaberta do quarto mas rapidamente voltava para o sofá para adormecer e esquecer que sua amada já ali não jazia como ele. A cama que, para ele, não fazia sentido, pelo menos só para ele.
Todas as manhãs, quando acordava, voltava ao quarto para enfrentar a sua dor e ter a certeza da sua solidão, abria a janela e voltava a fazer a cama que ainda guardava duas marcas corporais no colchão.
Nesse noite, decidiu ficar no quarto. Estava cansado das mesmas vozes da televisão que, apesar de o saudarem ou dele se despedirem, apenas lhe traziam notícias de um mundo triste, talvez mais triste do que ele. Adormeceu, ao lado do espaço côncavo da sua amada, para não mais acordar.



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