segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Músicas para Escrever XIII, Mogwai - End


No dia da morte de cada ser humano, antes de se ir para onde quer que seja que as crenças de cada um orientam e prometem em vida, cada um de nós, sem excepção, após inevitavelmente abandonar a sua vulnerável massa física outrora movida por necessidades, vontades, sentimentos, desejos, aspirações, deveria ser confrontado, de bata e bisturi, com o seu cadáver, talvez ainda quente para que nada passasse em vão.
Seria um momento de verdade, cada um fazer a sua própria autópsia:
quantas memórias terão ficado guardadas no sistema límbico? quantos remorsos e arrependimentos ainda vaguearão por lá? quantas sensações de frio e de calor? quantas vozes e palavras terão escutado ou ignorado os ouvidos? quantos segredos por esses mesmos ouvidos terão entrado?
quantas coisas belas ou angustiantes terão vistos os olhos? quantas lágrimas terão lavado o rosto? quantas fragrâncias terá sentido o nariz?
quantos aromas terá experimentado a língua?
quantas palavras terá proferido a boca? quantas feridas terão curado ou espezinhado essas palavras?
quantas vezes terá batido o coração movido por fortes sentimentos ou quantas vezes terá sido dilacerado? haverá alguma ferida aberta ou tudo estará cicatrizado?
quantos gritos terão soltado os pulmões? gritos de angústia, de raiva ou de exaltação?
quantas vezes se terá o estômago contorcido pelo nervosismo, pela hesitação, pelo medo?
quantas hemorragias internas provocadas por factores daqui e dali?
quantas cicatrizes ornamentarão o corpo e a história a elas associada?
quantos corpos terão tocado as suas mãos? que partes de cada corpo terão percorrido? com que propósito?
quantos quilómetros terão percorrido os pés para alcançar sonhos?
[...]
E, no final, depois de dissecada toda uma vida, aí, sim, seria hora de partir. As crenças estariam mudadas, talvez, um novo destino poderia ser escolhido ou talvez não, mas algum novo tipo de consciência teria sido despertado e, quem sabe, numa outra circunstância haveria vida novamente, diferente.  





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