NOITE DESAFORTUNADA: Bom
dia, ESQUECIMENTO!
(Porque é que a luz do
quarto tinha que estar programada para se acender quando toca o
despertador? Má ideia para dias como este!)
Não é que, de facto,
seja um bom dia, mas então, por que raio, é que digo bom dia ao
ESQUECIMENTO e não me calo ou me viro para o outro lado e adormeço
de novo e tento, assim, curar esta ressaca de sentimentos? Que mania
de cumprimentar tudo e todos e, na maioria das vezes, fazer figura de
idiota porque não se é correspondido, como aquele aceno que ninguém
vê, ou as palavras que ninguém ouve. Que mania de se acreditar que
todos reagirão do mesmo modo que se reage com eles. Tretas!, na
maioria das vezes não é porque não vêem, mas sim porque ignoram!
Quem é que nunca ignorou um aceno ou desviou o olhar para evitar
alguém?
(Por que é que tinha que
estar a chover hoje também?)
Espera, já me lembro do
porquê de ter dito bom dia:
Quis fazer-me amigo do
ESQUECIMENTO para que ele levasse tudo o que tenho no pensamento para
bem longe e me fizesse esquecer a quem tinha entregue as minhas
MEMÓRIAS. Ontem deitei-me e não consegui sonhar, pelo menos, com
não aquilo que necessito e que me ajudaria a encontrar uma realidade
que se vai esfumando sem deixar rasto entre as minhas MEMÓRIAS e as
imagens desse sonho vão ficando, aos poucos, cada vez mais
desfocadas. Mas até o ESQUECIMENTO se esqueceu de mim ou me ignora:
acenei-lhe, ensonado, e não reagiu, disse-lhe bom dia, para me fazer
ouvir e, nem aí, obtive algo recíproco.
(Será que vale a pena
sair da cama hoje? Será?)
O conforto caloroso da
cama nesta manhã fria e chuvosa faz com que este cenário se torne
num dos melhores remédios para tão agressiva ressaca de
sentimentos porque oferece várias hipóteses: hibernação social ou
alheamentos através de sonhos, sem termos que ver quem ou aquilo que
nos esquece, ou pior ainda, encontrar quem ou aquilo que nos vimos
forçados a esquecer sem intervenção voluntária do ESQUECIMENTO.
Se ainda alguém me
trouxesse um chá à cama era perfeito. No entanto, há algo que se assemelha a
um medo quando penso na hipótese de atravessar a porta do quarto e
involuntariamente ver alguém pela janela, ou que esse alguém me veja a
mim através dela. Mas terá que ser, vou à cozinha rapidamente e
volto para me enfiar aqui, como um ninja.
A CAMPAINHA!? (Quase deixei cair a chávena do chá!)
Alguém me viu. Não,
não! Não pode ter visto!
Não estou em casa. Deixa-me ficar aqui quieto.
Não, vou lá espreitar
em silêncio.
- Abre a porta, sei
que estás aí!
Como é que...?
- Sei que estás aí. Dá para ver a tua
sombra por baixo da porta?
Eu não disse que deveria
temer as janelas? Não diretamente por elas, mas através da luz que
entra por elas, acabei por ser visto. Que faço agora?
Deixa-me entrar!
- Bom dia! - (Disse
isto outra vez, depois de ceder e abrir a porta.)
- Tens a certeza
disso?
- Definitivamente,
não!
- Anda cá!
- Não sei se será
boa ideia...
- Acredita que é a
melhor.
- E se partes de novo?
- Não parto! Anda cá!
Não dei mais passos,
deixei-me cair na direção desse alguém que me descobriu e se me ofereceu delicadamente.
E foi assim que vim ter a este estado de quarentena, que eu próprio criei para me proteger!
Sem comentários:
Enviar um comentário